MONSTER é demoníaco: uma masterclass de roteiro, montagem, direção, já falei roteiro? Um argumento panahiano sobre bullying, parece bullying, mas vai além, mudando o foco constantemente – quem é o monstro? quem é o monstro? – se canta o filme inteiro e você, o público, não sabe, nunca sabe, ninguém sabe. Todos os personagens estão em busca do ser monstruoso, em busca do tal monstro, a criança é estranha, o pai está morto, a escola enfrenta sérios problemas e um tufão corre o risco de atingir a cidade… toda essa base de vida humana e sociedade está em perigo e Hirokazu Kore-eda faz o quê? Filma o que? Nada… tão somente. Seu filme sugere, engana, dissimula. Na realidade ninguém sabe o que procura. Portanto, ninguém sabe o que vê. Tudo acontece na escuridão do coração, some de repente aos toques do trombone e reinicia. Um estrondo que se repete três vezes: mentira, realidade e fantasia. Sim, o cineasta dá uma aula, transfere RASHOMON para a escola e é monstruoso no que faz.
Simplificando o que é impossível simplificar, é uma história sobre as angústias da juventude, a busca pelo amor, pela identidade, por sensações fortes enquanto se enfrenta a dificuldade de crescer. De um ponto de vista, repete os mesmos temas de sempre do diretor, o mundo das crianças como outrora em NINGUÉM PODE SABER (2004), O QUE EU MAIS DESEJO (2011) e ASSUNTOS DE FAMÍLIA (2018), senão contos de meninos pelo qual se desperta um sentido moral e é dessa moralidade que vai acabar destruindo um pouco a(s) pseudofamília(s). E então, em MONSTER também, mas um tanto mais profundo porque Yûji Sakamoto assina o roteiro, uma outra perspectiva literalmente, um ângulo mais espinhoso que torce a narrativa e cuja montagem acompanha essa percepção como se fosse um caleidoscópio.
O que torna a projeção num verdadeiro suspense, não só pela progressão em espiral, mas pelo método de se contar essa história aos olhos de cada personagem, tudo em seu devido tempo, sem correr, não agora, cada um se perdendo e encontrando em cena e cada etapa se somando em complexidade, cada capítulo marcado por verdades indiscutíveis que serão – veja só – discutidas novamente e donde o final culmina para uma legítima (e fantástica) ambiguidade, donde os monstros finalmente saem do armário e podem nos tocar. E se não for suficiente, a música de Ryūchi Sakamoto, seu último trabalho, certamente vai nos tirar o fôlego.
RATING: 81/100
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