Entre MAY DECEMBER, Natalie Portman e Julianne Moore, Todd Haynes filma o confronto de duas estrelas, dois mundos, a Primavera e o Inverno, de um lado o calor de Portman, a juventude que se pronuncia em excitação sexual, um agente de tentação; do outro lado a frigidez de Moore, a segurança que se congela em resignação, em melancolia pós-traumática. Ou talvez o oposto: o calor da felicidade doméstica, o quentinho familiar de um bolo de abacaxi feito por Moore frente a frieza calculista de uma Portman que busca a qualquer custo, mesmo pela fama dos tabloides, um meio para se destacar. Charles Melton é o centro, o “segredos de um escândalo” pelo qual orbita esses dois sóis, o homem (ou menino?) que se encontra na posição de “objeto de desejo”, sendo assim obrigado a reconsiderar sua vida e juventude perdida. Eis o filme.
O contexto é baseado em fatos: as manchetes relatam que uma professora foi condenada em 1997 por “estuprar” seu aluno da sexta série. Na prisão, ela pariu dois filhos do adolescente e após a sua libertação, eles se casaram em 2005. O casal ficou junto por algum tempo. O agora rapaz sempre afirmou que não era vítima e parecia orgulhoso do relacionamento, no entanto se separaram em 2019. Ela morreu depois de câncer em 2020, deixando seus bens ao ex-marido.
Não tão LONGE DO PARAÍSO ou CAROL, Haynes segue apontando os aspectos menos conhecidos (ou ignorados) de algumas histórias escandalosas, especialmente tratando tópicos que giram em torno da sexualidade e identidade pessoal como um estado fluido, maleável e interpretável. Aqui não é diferente, se outrora ele trabalhou grandes temas da cultura queer como atração interracial e lesbianismo, agora trata sobre amor pedófilo, mas de uma forma inusitada, torcendo a narrativa, invertendo os papeis conhecidos, marchando sobre um erotismo complexo. O faz em contornos sutis de comedia, um melodrama sonhador e melancólico, um jogo mesquinho de zombar dos personagens, tratando a história com seriedade, mas apenas na aparência.
Desse suposto humor, o argumento se tece delicadamente, como por inercia, para debaixo da roupa suja. A câmera curiosa é tão somente uma testemunha, uma confidente intima disposta e capaz de guardar sigilo para depois, fazer um filme “baseado em fatos reais”. Há um pouco de raiva aqui, certa paixão pelo suco pestilento do escândalo que envolve neurose e conforto típico de purgatório. É assim que, entre uma tarde de churrasco e uma manhã de baile, o roteiro se esgueira pelo “sonho americano”, demonstrando um prazer quase satírico em radiografar as deformidades habituais do subúrbio, pessoas comuns em lugares comuns. Um Reality Show portanto, ante ao um “Caso de Família”.
RATING: 76/100
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