Suzanna Andler

Há algo de blasé em SUZANNA ANDLER: todas essas pausas, as mentiras sórdidas, os relacionamentos doentios… Benoît Jacquot sequer esconde que é teatro, seu filme somente em dois atores – Charlotte Gainsbourg e Niels Schneider -, eles em um monólogo-prosa sob a luz pálida e fria, uma sucessiva geometria mental e sentimental – casa na praia, manhã e noite, muito travelling e planos gerais, close-ups e sussurros através das palavras –, e os personagens vagando sem rumo pelo espaço, uma sala, uma varanda, uma tarde de folga em Saint Tropez, um passeio nos anos 60. E a protagonista sempre entediada, esteja onde estiver, diante do amante melancólico, ou de um marido igualmente entediado ao telefone, ela parece estar em uma encruzilhada. Alguém diante de uma emancipação impossível.

Em nota, “Suzanna Andler é uma mulher escondida, escondida atrás de sua classe, escondida atrás de sua fortuna, atrás de todos os sentimentos acordados e as ideias recebidas. Ela não pensa em nada, está enfastiada”. O texto é de Marguerite Duras, um palco para espectros, silêncios, lacunas, as mesmas linhas gerais que nos remetem à HIROSHIMA, MEU AMOR. O papel naturalmente é de Charlotte Gainsbourg, cuja voz murmurante, o estilo de atuar e tantos floreios requintados de se mover, enfim de se apresentar em cena – você percebe -, está diretamente em consonância com o espírito da escritora francesa.

E não à toa a direção seja agora de Jacquot, o jovem assistente da cineasta, ainda vinte e poucos anos na época, com quem Marguerite trabalhou em um tanto de filmes, NATHALIE GRANGER (1972), LA FEMME DU GANGE (1973), INDIA SONG (1974)… e lá mesmo lhe confiou esse roteiro, “uma história do qual não gostava”, talvez pela arquitetura seca, a monotonia das indicações cênicas, “a grande sala de estar como um palco de teatro”, mas agora finalmente feito em filme, meio século depois e de forma mais ampla: além da extensão do palco para algo mais contemporâneo, a câmera agora rodopia sua protagonista em uma jornada imaginária, contornando ou confrontando a mise en scène, de acordo com as inflexões do texto. Sim, é um filme difícil, dificílimo vale ressaltar, mas vale o ingresso por esse vislumbre de Charlotte blasé em casaco de vison, sem dúvida.

RATING: 68/100

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REVIEW · ROTTERDAM

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