SE A RUA BEALE FALASSE, falaria bem devagar. Cada palavra, silaba e letra dita, teria uma tonalidade e o seu devido momento porque nada deveria ser pronunciado a menos que valha a pena gastar um longo tempo para se dizer. Ao final de cada frase, apenas silêncio. Ou talvez música, um tema de piano simples e romântico para embalar a desapressa. Barry Jenkins filma, então, esse monologo invisível, outrora um livro, agora um filme, afinal o conto de um jovem casal, um homem jovem e uma jovem mulher, ambos negros, ambos nos vinte anos, ambos sorrindo por toda a projeção, sob o crepúsculo, o som da cidade diminuindo em torno deles até se transformar num burburinho, nada além dos seus passos, o roçar das mãos dadas, só um momento, um frame, o éden… A tal rua observa em silencio e pensa numa complexa poesia, mas nada precisa ser dito. O cineasta já o fez em película.
E novamente, como em MOONLIGHT, Jenkins nos tira da escuridão e nos lança uma sombra. Seu filme é envolto de sonhos e ingenuidade, mas nos invade de melancolia, de fragilidade, de impotência. Fala de amor. De medos. De família. A própria história se divide em dois contos, duas famílias: Os tais jovens que pagam o crime de existir e a comunidade que se reúne para defende-los. O cerne é a injustiça, mas o filme versa sobre o amor, amor verdadeiro, amor impossível, uma bela história de amor que se desvia da questão central do racismo.
Sim, há um crime. Ponto. Mas nada se pode fazer, então a narrativa segue na balada do amor e da raiva, no tênue romance que testemunha inconscientemente as provações diárias dos negros. E é ali, entre os olhares apaixonados, os rostos enternecidos, o blues ao fundo, que realmente se vê a universalidade da opressão, o peso do mundo nessa jovem, uma entidade viva, tão frágil e familiar, mas também uma contundente metáfora do poder que o amor possui em agregar esperança a todos que precisam lutar pela liberdade. Em um ponto, a protagonista expressa que “é um milagre perceber que alguém te ama” e é através dessa personagem, da luta de Kiki Layne, que vemos exatamente o quão milagroso o amor é, especialmente quando, contra todas as probabilidades, é a única coisa que você tem para se agarrar.
RATING: 83/100
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