Um homem retorna a Kaili, a cidade natal de onde fugiu para, ali, começar a busca pela mulher que amava e por quem nunca foi capaz de esquecer. Seu nome era Wan Quiwen e, por esse nome, começa A LONGA JORNADA NOITE ADENTRO de Bi Gan, uma poesia de verbos. De imagens. Não de adjetivos. De detalhes. Um cinema de sangue, sangue jorrando da terra, correndo freneticamente em nossas veias e se espalhando, imenso, hipnótico, atordoante pela projeção afora. Um monologo macabro e febril de um homem falho, filmado sem parágrafos, sem quebras, num gigantesco plano sequencia persistentemente alucinógeno, com cores de Chagall, romances de Modiano e, imerso em mistérios e memorias, de emoções e sensações, nas reminiscências de um road-movie escrito e destruído por dentro e pouco a pouco. Ou então, um Noir, como o PACTO DE SANGUE de Billy Wilder, destruído em cada frame, cena após cena, e construído de novo do que sobrou, imagens emaranhadas e desafiadoras, em eterno labirinto, afundadas na noite, jorrando e correndo freneticamente como a eufórica sinapse no interior de nossas células cerebrais. É tempo. É espaço. É a memória, primeiro em 2D, depois em 3D, como se um espelho girasse em torno de cada lembrança e revelasse um novo caminho ou outra encruzilhada de diferentes linhas de tempo, de sonhos, da realidade, afinal do nascimento do cinema. Então, Big Bang: A luz se faz e por ela – em neons – se cria uma atmosfera estranha e torrencial, reminiscências de Wong Kar-wai. Não existe história. Apenas um fluxo continuo donde um homem se prepara para procurar uma mulher. E nada mais. A busca de um homem, a Divina Comédia, um convite para uma jornada… se o público acredita que os personagens estão vivos ou mortos, dormindo ou acordados, não importa. A jornada continua tateando a noite pelas ruinas, os lugares, o encantamento. Um filme virtuoso que se desdobra pelos pensamentos e donde nós – o público – sonhamos? Assistimos? Já estamos longe. Bem longe…
RATING: 83/100
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