Jeannette: A Infância de Joana d’Arc

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Depois de suas incursões pela comedia, na TV com O PEQUENO QUINQUIN e no cinema com O MISTÉRIO DA COSTA CHANEL, Bruno Dumont resolve embarcar pelo musical com JEANNETTE. E o faz pela aventura, no mais intenso, infinito e esmagador da expressão, pelo texto de Charles Péguy, pelo impressionante uso de prosa e verso, em gênero e estilo, no som e na fúria, em estado de graça, pelos anjos, pelos santos, para enfim libertar Joana d’Arc, a jovem, o mito, a mártir.

Seu filme, então, é uma fascinante opereta cinematográfica, filmado em poesia, música e mistério, declamado em polifonia, rock e eletropop, tão estranho, tão bizarro, extremamente estonteante. Nesse libreto, a infância de Joana, antes de Dreyer, Bresson, Besson e Preminger, dos icônicos filmes que citam sua PAIXÃO, o PROCESSO, a guerreira, a santa, outrora Maria Falconetti, Florence Delay, Milla Jovovich e Jean Seberg, mas, aqui, uma criança, o gene de um país, sua identidade, seus ideais, nada mais que o milagre que une tantos franceses – monarquistas, populistas, nacionalistas, socialistas, agnósticos e devotos – por essa figura, essa voz. Imprevisível. Incompreensível. E mesmo assim nos surpreende e (en)canta.

Ao longe, sabemos, haverá a alma atormentada pela condenação divina, a injustiça da Graça, amada por Deus e, depois, abandonada, condenada pelo rei, canonizada pela igreja, mas quem, afinal, é essa mulher? Dumont vai nas sombras e dali, filmar suas motivações, senão a vocação em seu germe, no mais pequeno e simplório, no embaraço e hesitação de duas meninas, no campo, na juventude, primeiro aos 13, depois aos 16. Na tela, surgem jovens, não profissionais, inocentes, o suficiente para improvisar e declamar. E, depois, com a projeção, o despertar – de corpo e alma, de canto e dança -, a coreografia cada vez mais intensa, em rodopios, enquadramentos, dialogo e roteiro, vemos um fluxo continuo de imagens e ritmo, tão intenso, tão lírico, quase hipnótico. Diria (sobre)natural.

E é assim pela energia furiosa da trilha eletrônica, um som psicodélico que invade a tela em espasmos e convulsões, um tanto intrigante pela melodia rítmica, a pontuação instrumental, as vozes a capela, o canto gregoriano. E, depois, a formação da protagonista, a missa da heroína que surge diante de nossos olhos, através da dança, nesse frenesi, na fervura, a coreografia imersa nesse processo orgânico de oração, selvagem, sagrado, quase num estado de perplexidade mística. É o clamor das palavras, sua sonoridade, o discurso, os ecos. Que atordoa, ame ou deixe, e, sim, é diferente de tudo o que já foi feito, seja poesia, teatro, cinema ou catarse.

(*) Crônica livremente inspirada do material cedido pela Lux Box Films, incluindo a entrevista com o diretor
RATING: 77/100

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REVIEW · CANNES · RIO

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