O Discípulo

O DISCÍPULO se estende por três décadas tentando capturar não apenas a jornada de uma vida dedicada à arte, mas também a essência de uma subcultura – a tradição Hindustani – que muito prosperou na Índia desde o século XIV. Um exótico filme sobre música clássica indiana para nos tornar ouvintes ávidos, além de estudiosos dessa rica melodia, as várias complexidades, as nuances e contradições das várias canções religiosas, as baladas folclóricas, afinal o legado dessa música popular. Um cinema quase épico, em muitos níveis filosóficos e práticos. Daqueles títulos cujo desafio é recriar a cultura de um povo, de Mumbai à Marathi, como o era nos anos 90, com toda a sua textura, suas cores, quase romântico em sua estética nostálgica e emocional.

Então, Chaitanya Tamhane meticulosamente dedica cada frame para observar e iluminar a relação entre aluno e mestre, o discípulo e sua música. E o faz de transcendente voz cinematográfica, seu filme quase um ensinamento universal de vida, não importa onde no mundo, não importa quem ou como, poderia ser a história de um atleta, ou de uma bailarina ou de um poeta; acontece de ser um vocalista. E com ele, nos sentimos abraçados, ao som de tablas e saragis, tudo muito misterioso e intrigante; os segredos, a mitologia, os gênios e os tolos, os críticos e os amantes… é algo novo. Surpreendentemente belo. A própria relação do protagonista e a perspectiva do mundo em que vive mudam e evoluem constantemente ao longo do filme. E quando se trata da música, ela surge num transe, poderosa e hipnotizante o suficiente para nos transportar à Brahma, Shakti ou Saraswati – oh, os deuses!

E não, este não é realmente um filme típico sobre um cantor ou um filme educacional sobre música clássica. É o conto de um sonhador que não quer enfrentar o mundo “real” e encontra sua fuga através da arte. Sua identidade está ligada à exploração do que é puro, o que é imaculado. Ele foi criado com a crença de que a devoção incondicional revelará respostas a tantas perguntas. Essa crença lhe foi ensinada por seu pai, que também é um escapista. E assim como eles, tantos outros – dançarinos, atores, escritores – acreditam em algo além do que já vemos, que a arte não é apenas ilusão, mas algo real, quase apoteótico. E são pessoas que infelizmente com o passar dos anos, o confronto com a vida, com a sobrevivência ou mortalidade deixam de sonhar. Na realidade, esses sonhos, sejam nossos ou projeções de nossos pais, não são frustrados em um instante, mas murcham gradualmente. E ainda assim, a vida continua. De ilusões. De divindades. De arte… desse cinema, inclusive.

(*) Crônica livremente inspirada do material cedido pela WOLF Consultants, incluso a entrevista com o diretor
RATING: 73/100

TRAILER

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FILMES · TIFF · VENEZA

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