De glitter, caprichos, pompons e pôneis, Sol Berruezo Pichon-Rivière vai filmando uma pequena e delicada caixinha de música: sua câmera, tal qual uma bailarina, vai dormindo e sonhando, sentindo e arrepiando, dançando com sutil encanto, enquanto o filme se desvela na valsa de volteios incertos, rodopiando e rodopiando nesse micro universo particular, a história de uma menina, cuja irmã foi nadar e nunca mais voltou. E com essa tragédia, vieram as primas, veio a tia, veio a avó, todas cuidar. E essa guria guardando seus sonhos, suas emoções, seus segredos nessa caixinha para toda noite ouvir bem baixinho… MAMÃE, MAMÃE, MAMÃE, ela toca, tão alto quanto as batidas do coração, tão discreto como a respiração daquelas que dorme. A menina sonha, vai crescendo, sua vida uma ciranda de roda… e girando e girando, damos cordas nesse cinema de encantos.
Então, um conto de inocência, de garotas trancadas no quarto, da mãe chorando baixinho, esse universo de infância e tons pasteis, a fotografia quase num sussurro de memória e as meninas brincando de cinema, nos mergulhando no mais lindo ser feminino, o medo de nunca ter beijado, o medo de ficar sozinha por toda a vida, a menstruação “que são bebês que não podem nascer”, o corpo que não pertence mais à mesma pessoa que o habita e a mudança, a mudança irreversível da maturidade.
O olhar de Sol é tão afetuoso, sua narrativa transcorre como um pequeno mistério, os segredinhos da infância, da puberdade, das meninas se tornando mocinhas, se descobrindo, tomando corpete… lá fora, atrás da porta, a mãe chora copiosamente, mas você não percebe a tristeza, porque a imagem chave é das meninas em seu dia a dia, todas na mesma cama confabulando, penteando os cabelos, fazendo tranças, cuidando uma das outras. Há uma beleza nesse cotidiano que não se vê retratada em nenhum outro filme. Talvez um leve flerte com AS VIRGENS SUICIDAS de Sofia Coppola, mas muito pouco. E ao final, nos créditos, você até compreende os porquês desse filme tão delicado: toda a equipe é composta de mulheres, em todas as frentes e funções técnicas (!), sim, um filme no feminino, literalmente.
RATING: 73/100
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