Coringa


“Sorria! Ponha um sorriso nessa cara!”. Assim Nat King Cole cantava, assim sua mãe lhe pedia, mas não há qualquer alegria, nenhuma risada, sequer um sorriso… “E o que há para rir, monstro?”. “É horrível, não é?”. Então, Todd Phillips filma a piada mortal, a história de um louco que sorria enquanto seu coração estava doendo, que ria enquanto sua mente se perdia, que gargalhava através do medo, da tristeza, mesmo com uma lágrima sobre a face. Uma lágrima escura e pintada da qual sai o horror. A lágrima para esconder o sorriso. O riso para esconder a loucura. A gargalhada para enfrentar o mundo cada vez mais louco.

Na tela, muitas estrelas – Jack Nicholson, Heath Ledger, Jared Leto – já usaram a máscara sombria do palhaço, a tinta branca no rosto, o sorriso vermelho torto, mas nenhum é tão assombroso quanto Joaquin Phoenix: O HOMEM QUE (não) RI tão frágil, intimidado, marginalizado e pisoteado e cada vez mais fundo nesse abismo. E sempre sozinho na multidão. Cercado de pessoas em uma cidade hostil repleta de divisão e insatisfação. Um homem com duas máscaras. A primeira do palhaço. A segunda do louco. O homem incompreendido a quem a vida repetidamente lhe bate. Sem pai, a mãe frágil e mais ninguém. Intimidado por adolescentes nas ruas, insultado por seu terno no metrô ou simplesmente provocado por seus colegas de trabalho, vemos um homem, um fakir e um sorriso. E – Por Deus! – todos vão se sentar e prestar atenção porque o palhaço entra em cena. O show começa. E o público, que outrora o ignorava, depois ria, por fim vai morrer.

E com eles, Gotham City. Não a cidade grotesca dos gibis, mas o universo scorseseano de TAXI DRIVER e O REI DA COMÉDIA. Uma cidade que (in)surge nas ruas ensopadas de néon, nos grafites encarquilhados do metro, no lixo que apodrece nas calçadas. Esse é o cenário do caos, da insanidade, o início do crime. O precipício pelo qual Phoenix se equilibra, ora na gargalhada, ora nas lagrimas, o público junto nessa corda bamba, hipnotizado pela estrela desse personagem quebrado. Logo, a tragédia se avoluma, torna-se comédia, mas ninguém ri. “E o que há para rir?” Sim, é horrível. E soberbo. Sim, você vai sorrir, mas o riso é de nervoso.

(*) Crônica livremente inspirada do material cedido pela Warner Bros., incluso entrevista com a diretor e notas de produção
RATING: 85/100

TRAILER

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FILMES · TIFF · VENEZA · SAN SEBASTIAN

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