Brother’s Keeper

BROTHER’S KEEPER é um cinema de medo. O medo que se aloja no internato – na Turquia são milhares. O medo que congela as pessoas na apatia, nada além de uma estranheza fria, um filme frio, situado numa terra fria, donde você pode imaginar é sempre inverno. E essa é a rotina: cabelo curto, rédea curta, três refeições, cama quente, um banho por semana e… medo. E silêncio. Sem música, sem comentários, sem quase nada, o filme começa num banho frio e se impõe em grande silêncio. Na tela, o cotidiano desse reformatório, espécie de CARANDIRU mirim donde a violência – o assédio moral – é odioso. Ali, um menino adoece – está congelado de medo, parece – cabe ao outro ajudá-lo. Então, Ferit Karahan filma sua própria história, suas memórias de infância condensadas em outro menino – Yusuf, 12 anos – e sua via sacra na neve – literalmente – para salvar o amigo, algo tão simples, mas não na Turquia, não na burocracia da escola ou a indiferença de seus gestores.

Não há febre, naturalmente, mas o diretor filma com ódio, cada frame carregado de indignação, de intensidade, de uma força profana, como se esse filme fosse uma terapia, ou a forma de confrontar seus traumas. E você o vê espelhado aos olhos desse garoto, o medo se assomando, arregalado, espantado, as tentativas fúteis de falar com algum adulto, mas nada acontece porque ele é “apenas tijolo na parede”, e tudo está frio porque a calefação não funciona, os adultos não funcionam, patinam sem parar e a neve se esbalda no roteiro avalanche, dessas histórias sem retorno que Asghar Farhadi certamente faria no Irã.

A estética, no entanto, sugere outro cineasta: os filmes gélidos do cazaque Emir Baigazin, os mesmos não-atores, a mesma fotografia acinzelada, o mesmo rigor antropológico que, aos poucos, ilumina a violência da cadeia alimentar e sempre de mãos dadas com a evolução (ou involução) do protagonista, cada vez mais catatônico. O resultado é um lento e insidioso ruminar sobre o medo, de como ele nos provoca nesse microcosmos, a princípio para “a escola” disciplinar, para os professores inspirar, de certa forma controlar essas crianças, “normalizando” o indivíduo, ou não… porque uma pessoa acuada é imprevisível.

Daí este filme donde, pelo clima de opressão, todas as formas de relacionamento se agarram em um tênue fio. Onde existem duas crianças, dois amigos, um certo vínculo, algo real, que existe, está lá, mas na verdade, não é nada. O sistema de alguma forma nem sequer permite isso. Tudo é baseado em uma mentira e as pessoas têm que mentir o tempo todo. Como as condições são tão duras, mentir torna-se outra maneira de dobrar um pouco essas paredes. Quase se transforma em resistência, ainda que “tudo seja apenas um tijolo no muro”, cantaria Pink Floyd. O medo é o cimento.

RATING: 74/100

TRAILER

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REVIEW · BERLIM

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