A Substância


Body Horror no osso, EVIL DEAD na pele, A SUBSTÂNCIA revoluciona e rejuvenesce um gênero que, de tempos em tempos, apresenta algo relevante, mas é agora, nesse gore visceral de Coralie Fargeat, que vai (literalmente) explodir. Demi Moore, gata, você foi “Cronenbergada”, mas A MORTE LHE CAI BEM, viu? E não só ela: Margaret Qualley está no auge da beleza; Dennis Quaid, no da repugnância, em um filme que funciona (ou entretém?) sobretudo pela direção: a câmera obcecada pela beleza, observar e ser observado, julgar e ser julgado, enquanto o desejo feroz de resgatar (ou manter?) o que se perdeu, desequilibra a balança. Não é pouca coisa e nem à toa as referências: a cena inicial que evoca CREPÚSCULO DOS DEUSES; a sequência final, insana, que remete à 2001: UMA ODISSEIA NO ESPAÇO… mas é no flerte com CARRIE, A ESTRANHA que a narrativa encontra seu coração. Sim, este é um filme de estrela, que aspira às estrelas, e que, sem dúvida, será imortalizado.

A trama, embora simples, subverte as convenções do body horror. Passa – como não poderia deixar de ser – por (todos) os Cronenbergs e ecoa títulos dos anos 80, como VIAGENS ALUCINANTES, O VINGADOR TÓXICO, A MARCA DA PANTERA… difícil mensurar (tant)as referências, pois o roteiro atira para todos os lados. Ainda assim, mantém a assinatura de Fargeat, vista anteriormente em REVENGE: aquele grotesco que inicialmente sexualiza a mulher até o ponto de objeto para, depois, explodir em violência – aqui, corporal – até o limite da sátira.

O texto, premiado em Cannes, carrega certa “substância”. É grotescamente simples ou simplesmente grotesco? Não importa: a mensagem é clara e direta, quase didática, sobre a fama e a juventude e necessariamente as obsessões de Hollywood com essa fama e juventude. E, veja bem, escrito e dirigido por uma mulher e donde – veja só – ressuscita a carreira de outra mulher aos 60 anos e adota o mesmo fetiche ao qual pretende denunciar.

Como crítica à Hollywood narcisista e sua eterna estupidez, o filme exige uma abordagem incisiva. É genial e cruel em seu voyeurismo obsessivo, onde o corpo é o palco, todos os closes de bunda e nudez no chão do banheiro, essa carne e pele e seios se rastejando desesperadamente em direção à fama, em direção à própria estrela na avenida, como outrora Gloria Swanson desceu as escadarias em busca de seu close-up na Sunset Boulevard, ou mesmo Mia Goth nos holofotes de MAXXXINE ou Bette Davis e afinal O QUE TERÁ ACONTECIDO A BABY JANE?

Nesse pastiche, panfleto ou parábola, a cartilha parece clara: “Hollywood é ruim”, “as jovens atrizes são meros camarões a serem deglutidos”, “não confie em substâncias suspeitas encontradas em becos escuros”. Fargeat entrega um debate vertiginoso, que agrada às massas, desafia a crítica e entrelaça camadas e donde o público sairá decepcionado ou extasiado, mas isso pouco importa. Afinal, a beleza está – sempre – nos olhos de quem a vê.

RATING: 84/100

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FILMES · CANNES · TIFF · SAN SEBASTIAN

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