O Conto dos Contos


Dois irmãos albinos, advindos do coração de uma fera, cozido por uma virgem, alimento da rainha glutão, cujo rei em prova de amor ou coragem foi ao mar, para caçar e morrer. Isso em um reino imaginário, lar de uma corte bufão, cheia de circo e malabarismo, labirintos de pedra e castelo rococó. Seria O CONTO DOS CONTOS, desses irmãos separados no berço, um príncipe e um serviçal, laços de sangue e magia, ou da agua translúcida que se esvai da raiz de uma árvore? Che bello raperonzolo!

Ou seria o conto de um rei libertino, apaixonado pelo canto de sereia de velhas fiadeiras, perdido no sórdido joguinho do desejo, no dedo de juventude, enquanto a velha apaixonada, atirada de uma janela, perdida na floresta, mama da teta de uma bruxa, para dali extrair seu frescor, os cabelos dourados, a pele alva, os lábios vermelhos como os lençóis do nobre rei, de mil e uma noites de luxúria e devassidão? Che bella addormentata!

Ou seria outro conto de outro reino, rei sapão e seu bichinho de vários truques e desejo, sangue e carne fresca. Enquanto a filha canta e se perde, os dedos nos cachos, a cabeça nos homens, no beijo que não vem, no príncipe que não virá, porque seu pai está entretido com outros brinquedos? Pobre menina perdida em pele de asno, na pele de pulga. Pobre bela diante da fera, ou do ogro gigantesco que a leva para longe, bem longe. Tristi la bella e la bestia!

E as três histórias rumo à floresta, a coragem pelo fraterno sangue, a juventude pelo vigoroso leite, a sabedoria pela insensata honra. Na floresta donde se acaba a infância, donde se começa a adolescência. O lugar que separa meninos de homens, princesas de rainhas, o conto dos contos. Ali, tudo se perde, o medo, os laços, sua majestade. Afinal, separar o que é inseparável. Cada desejo, cada ação, e da forma mais violenta possível. Eis a mágica que, do nada, vira pó. E se esvai com o tempo. Como pó de fadas. Como um conto de fadas. Assim é a realidade metafórica que Matteo Garrone nos propõe. “Il racconto dei racconti” de uma Itália perdida e, sim, sordidamente cruel.

RATING: 73/100

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FILMES · CANNES · RIO

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