O Som ao Redor


Em 2005, já houve certo zunzunzum em torno de ELETRODOMÉSTICA, o curta de Kleber Mendonça Filho donde o ruído se faz em torno de uma empregada, uma família e uma televisão de 29 polegadas. Um pequeno filme de sexo, controle e prazer, cujas ninharias nos fascinam e se refletem, agora, maiores nO SOM AO REDOR, por toda uma vizinhança e, literalmente, na briga de duas irmãs que se esbofeteiam por uma TV (de 40 polegadas!) e cuja tensão leva a dona de casa a encomendar mais maconha do entregador de água, além de se esfregar com sua máquina de lavar.

E assim, de historietas, personagens e lugares, se constrói esse barulho suburbano, O SOM AO REDOR de todos: Uma visão voyeur de um quarteirão de Recife, o microcosmo do “normal” e “anormal”, mistura sutil do presente de todos os dias e de todos os atritos e onde os pequenos delitos ocorrem à vista de cada condômino e cada vigilância que todos os personagens parecem ter e desconhecer. E é sob esse escopo, donde se desenha um tipo sutil de conflito – caótico, invisível, misterioso – totalmente alheio da narrativa, que se assoma em cenas aleatórias, empilhadas em esquetes, e cujo suspense, não se sabe como, é onipresente. Os moradores estão sempre cautelosos, mesmo em situações de lazer: É o instinto de sobrevivência diante do perigo, dos sons, do cachorro que late, do carro que buzina, do mar que revolta, da serra que trabalha, confinados entre grades, paredes, portões e muros. Tudo distante, vigiado, observado, como se estivéssemos diante de uma câmera de vigilância. Ou talvez em 1984. E que, ao final, não se vê. Ninguém vê aliás.

Sim, tudo é sugestão, alienação, intriga… Mérito de um trabalho de direção e roteiro extraordinário que pontua o suspense com momentos tragicômicos e diálogos inspirados, que nos afoga em uma nuvem abrangente de ruídos e tons escuros, de zooms e movimentos opressivos e que, do nada, se evapora, deixando o público com seus medo e sentimento. E talvez esse seja o grande truque: O golpe final do martelo de um cineasta-gênio. No final, conclui-se que O SOM AO REDOR é nada. Paranoia? Frustração? Absurdo? É apenas um fiapo de narrativa que nada tem a contar além de esboços e alucinações. Que poderia durar 20 minutos, mas são 2 horas. E passam rápidos. Muito rápidos e triviais. Afinal, sobre o que é este filme? E é desta incerteza, dor e burburinhos, que reside sua grande riqueza.

RATING: 84/100

TRAILER

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FILMES · LOCARNO · RIO · MOSTRA SP · ROTTERDAM

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