A Eterna Juventude de Deuses e Monstros


À véspera da quebra da Bolsa de Nova York, no ano em que o Empire States começou a ser construído e o gângster Al Capone foi condenado, a indústria cinematográfica viveu uma revolução: O cinema, tão jovem e tão ingênuo, falou pela primeira vez e (en)cantou o mundo com um cantor de jazz.

Dois anos depois, em 16 de Maio de 1929, o mesmo cinema unificou sua voz e falou através de 200 personalidades em um tranquilo banquete no Hollywood Roosevelt Hotel. Celebrava, assim, o segundo aniversário da recém-formada Academia e se aplaudiu os vencedores do primeiro Oscar da instituição onde – veja só – todos os filmes premiados eram mudos.

84 anos depois, à véspera da quebra do Euro, com o 11 de Setembro TÃO FORTE E TÃO PERTO e Al Capone já retratado em mais de 50 filmes, a indústria cinematográfica vive outra revolução: O cinema, agora centenário, extravasou a tela em busca de uma terceira dimensão e encantou o mundo com eco-alienígenas azuis. É um apelo diante da pirataria digital: A esperança de retornar o cinema ao seu Monte Olimpo, reviver sua Era de Ouro, seu glamour, sua apoteose de Deuses e Monstros. Enfim, a esperança de renovar e celebrar suas origens.

Então que seja – e curiosamente – através de ASAS: O único filme mudo a ganhar um Oscar de Melhor Filme. E é assim, com pompa e circunstancia, com restauração vibrante e meticulosa, que a AMPAS celebrou no Samuel Goldwyn Theater, os 100 anos da Universal Pictures, as suas raízes e, principalmente, os filmes – Sua razão de existir e seu lema em 2012.


E não à toa, uma semana depois, se anuncia os indicados ao Oscar 2012, talvez o último de nossa humanidade segundo os Maias, e, surpresa: O ARTISTA, filme mudo, francês, que festeja a aurora do cinema hollywoodiano levou 10 indicações. Seu oponente é simplesmente A INVENÇÃO DE HUGO CABRET, filme em 3D, americano, que festeja a aurora do cinema europeu e 11 indicações. O resultado desse embate de lembranças perdidas, nada mais é que um convite à nostalgia, ao CREPÚSCULO DOS DEUSES e a um cinema quE O VENTO LEVOU.

É natural, portanto, que O ARTISTA, o filme que emudeceu Cannes com sua ousadia, seja o favorito em cada uma das categorias que concorre, mas principalmente em Filme e Diretor. Porque não existem palavras adequadas para descrever a sinergia que é essa historia. Um filme para ver e sentir. Um tesouro que Michel Hazanavicius nos propõe. Uma visita à Hollywood dos anos 20, onde Bérénice Bejo se torna a nova estrela do cinema falado enquanto o brilhante astro do cinema mudo, Jean Dujardin, desce ao inferno. E eis um inusitado melodrama, em preto e branco, para radicalizar as mega-produções 3D de nosso século.

E é natural que A INVENÇÃO DE HUGO CABRET, uma inusitada aventura que veio para radicalizar as mega-produções 3D de nosso século, seja seu oponente. Porque àqueles que leram o livro homônimo de Brian Selznick, primo de David O. Selznick, um dos maiores produtores da história do cinema, vencedor do Oscar por E O VENTO LEVOU e REBECCA, logo vão compreender rapidamente o quão este livro é simplesmente perfeito para um cinéfilo como Martin Scorsese. Mais do que apenas um romance, eis uma historia que combina imagens e palavras em um tom perfeito para um filme. É assim porque logo nas primeiras palavras, nos primeiros esboços, tudo parece nos levar a uma sincera e profunda homenagem à imagem em movimento. Em suma, um livro como este, além de uma grande história, é um retorno às raízes, primeiro para as crianças, mas também para um público mais amplo. Serve para Scorsese sair da Máfia, da Itália, de Nova York, De Niro e DiCaprio. Sem violência, sem psicose, sem Cristo e fazer uma viagem à infância, à magia, ao sonho e, principalmente ao show.

E é o show que Hollywood almeja: Sua matéria prima. E é por tudo que O ARTISTA representa, corteja, encanta, saboreia, dança, sapateia e, principalmente, sorri que lhe credencia ao favoritismo incondicional do Oscar 2012. Isso e a centena de Prêmios precedentes concedidos pela crítica – seja pela americana (com o Critics Choice), seja pela estrangeira (com o Globo de Ouro) – e pela indústria em geral, e falo das Guildas americanas, dos ingleses (através do BAFTA), dos espanhóis (através do Goya) e finalmente dos franceses (através do César).

O resto é fumaça. HISTÓRIAS CRUZADAS para confundir e iludir. Boatos para tornar uma premiação previsível em algo imprevisível. Muitos dos Oscarbuzzers falam de uma possível vitoria do filme de Tate Taylor. Digo que é bem improvável (Uma vitoria seria realmente o prenúncio do fim dos tempos). É assim porque um filme com apenas quatro indicações, esnobado em Direção e Roteiro, geralmente não ganha um Prêmio desses. Houve casos? Sim, mas não deve se repetir em 2012 pelo bem do cinema.

Se houver uma alternativa, uma terceira via, então a possibilidade é (são) os favoritos na categoria de Roteiro. De um lado, o adaptado (OS DESCENDENTES); Do outro, o original (MEIA-NOITE EM PARIS). Ambos, a sua maneira, cortejando o passado e cortejando o futuro.

É curioso como o Oscar 2012 tenta desesperadamente rever o passado. Entre os coadjuvantes, concorrem dois medalhões do cinema. Juntos somam 340 títulos. Jamais ganharam. Hoje é (será) o grande dia de um deles. Em primeiro lugar, Plummer, Mas Max Von Sydon tem mais idade – mais história, Ingrid Bergman no currículo… Enfim, é uma possibilidade. Entre as coadjuvantes, as histórias se confundem (cruzadas?): Octavia Spencer e Jessica Chastain, amigas em tela, adversárias nos holofotes, se destacam para o Prêmio, mas sem grandes dúvidas. A atriz negra deve repetir, fácil, o feito de Hattie McDaniel em 1940.

Para os protagonistas, a disputa é mais intensa. George Clooney, aos poucos, conforma-se com seu clone francês: Dujardin parece um contender imbatível, mas teve um duro golpe de seu povo: Perdeu o César e, assim, o favoritismo pleno. Entre as atrizes, nada definido. A DAMA DE FERRO com sua 17ª indicação é uma ameaça – sempre foi – , mas uma espécie de hors concours. Melhor apostar em Viola Davis ou, até mesmo, em Michelle Willians, pois nunca se sabe como os votos se dividiram.

Fato que não deve se repetir com RANGO. Outra homenagem, outro retorno às inquietas origens, ao mainstream avant-garde dos três Sergios (Leone, Corbucci e Sollima) e, ao mesmo tempo, um salto tecnológico que redefiniu a animação. Um faroeste genuíno, ora regido pelo tom alucinógeno, ora por Carlos Castañeda (ou mesmo o tatu-guru a procura do espírito do oeste). Sim, o Oscar olha para trás e, parece, no rumo certo. E nós, extasiados, cantamos na chuva em plena felicidade por esse retorno.

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