32ª Mostra SP: Retrospectiva Kihachi Okamoto

O Japão milenar torna-se centenário no Brasil. Para celebrar com a Mostra o Centenário da Imigração Japonesa, não por acaso a escolha recaiu sobre o mestre Kihachi Okamoto (1924 – 2005). Ele é símbolo de uma era de ouro do cinema japonês construída por talentos abnegados, quase anonimamente, sem o conceito autoral depois consagrado pela primeira geração dos críticos-cineastas dos Cahiers du Cinema da França. Os seus filmes seriam exibidos nos cinemas da colônia japonesa em São Paulo sem chamar então a atenção dos críticos. Okamoto, servindo as ordens do seu estúdio, adaptava-se a todos os gêneros. Com a revisão de sua obra, eleva-se a estima pelo cinema de Okamoto e evidencia-se a sua personalidade exemplar, capaz de deixar a sua bela assinatura mesmo em condições desfavoráveis na ciranda dos interesses dos estúdios de cinema.

Como na vida dos grandes estúdios, a história de Okamoto assemelha-se a dos imigrantes japoneses no Brasil, especialmente em São Paulo. São histórias de pioneiros abnegados que só o tempo revela para a nossa emocionada admiração. É bem este o caso de Kihachi Okamoto, um cineasta maior, resgatado para o reconhecimento póstumo de gerações de cinéfilos e que tem seus filmes agora alçados à categoria de obras-primas.

Veremos nesta rara oportunidade em retrospectiva as extraordinárias qualidades de Okamoto, cineasta que circulou por todas as vertentes do cinema japonês com total desenvoltura. É de Bruce Eder, crítico americano e grande conhecedor do cinema japonês, a máxima “Se Kurosawa é o John Ford dos filmes de samurais, OKAMOTO é o Samuel Fuller do gênero”. E Susan Sontag chegou a juntar Okamoto, Akira Kurosawa e Kon Ichikawa pela mesma, “concepção fundamentalmente épica do cinema”. As observações estão no Cahiers du Cinema España, de abril de 2008, em artigo de Roberto Cueto, por ocasião da retrospectiva apresentada na Cinemateca Espanhola.

Okamoto tornou clássicos tanto seus filmes sobre samurais quanto gângsteres, tanto sobre a guerra que o marcou, quanto sobre a sua paisagem natural do pós-guerra, num Japão que rapidamente se adaptava à modernidade conflituosa imposta pelo ocidente vitorioso. Grande admirador de John Ford, inseriu suas referências aos conflitos do western em quase todos os seus filmes. Em Desperado Outpost, por exemplo, de 1959, Okamoto transpôs os elementos do western para o front da Manchúria em plena Segunda Guerra Mundial.

O então estudante da Universidade Meiji e assistente de produção nos estúdios da Toho conheceu os horrores da guerra ao ser recrutado com 19 anos e partir para as batalhas navais no Pacífico Sul, em 1943. Apaixonado por cinema, interrompeu assim a sua vibração por filmes americanos de ação e comédias francesas. “Foi um milagre eu ter sobrevivido à guerra, já que as estatísticas mostram que o maior índice de mortos foi daqueles que, como eu, nasceram em 1924”, disse depois em uma entrevista ao professor e escritor americano Peter B. High. Marcado pelos horrores da guerra, insere-se na mesma galeria de autores do cinema japonês do pós-guerra como Yasuzo Masamura, Masaki Kobayashi, Kenji Misumi e Seijun Suzuki (homenageado com retrospectiva na 23ª Mostra).

Terminada a guerra, Okamoto retornou aos estúdios da Toho em 1947, dessa vez como assistente de direção de Senkichi Taniguchi, Masahiro Makino, Mikio Naruse e Ishiro Honda. Foram precisos quase mais dez anos para surgir a oportunidade de dirigir o seu primeiro longa-metragem Tudo sobre o Casamento, em 1958. Como nos clássicos de Ozu, a comédia de costumes acaba servindo de pretexto para fazer do filme um ótimo retrato de época com todos os anseios e inquietudes de sua geração.

O seu prestígio no estúdio firmou-se com os filmes seguintes sobre o submundo, os gêneros de film noir e musical, os conflitos humanos, a guerra, e, sempre de modo notável, a saga dos samurais. Dois atores em especial, Tatsuya Nakadai e Toshiro Mifune, ajudaram a alavancar o seu prestígio de cineasta. Com humor único, o domínio de tempo, movimentos de câmera e demais idiossincrasias consegue fascinam agora legiões de admiradores ao redor do mundo, reconhecendo nesses seus atributos o inconfundível “Toque Kihachi”. Confiante no toque, funda a própria companhia, Kihachi Productions, em 1974. Morreu em 2005, aos 81 anos, deixando um total de 39 filmes. A descobrir também.

Retrospectiva Kihachi Okamoto
A BATALHA DE OKINAWA (GEKIDO NO SHOWA-SHI OKINAWA KESSEN)
A ERA DOS MATADORES (SATSUJINKYO JIDAI)
A ESPADA DA MALDIÇÃO (SATSUJINKYO JIDAI)
A VIDA ELEGANTE DO SR. COMUM (EBURIMAN SHI NO YUGA NA SEIKATSU)
BALA HUMANA (NIKUDAN)
DESPERADO – POSTO AVANÇADO (DOKURITSU GURENTAI)
FORTE SEPULTURA (CHI TO SUNA)
O GUERREIRO VERMELHO (AKAGE)
O IMPERADOR E UM GENERAL (NIHON NO ICHIBAN NAGAI HI)
O ÚLTIMO TIROTEIO (ANKOKUGAI NO TAIKETSU)
OH, MINHA BOMBA! (AH, BAKUDAN)
OS SETE REBELDES (KIRU)
RUFIÃO DO INFERNO (JIGOKU NO UTAGE)
TUDO SOBRE O CASAMENTO (KEKKON NO SUBETE)
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FESTIVAIS

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